segunda-feira, 18 de junho de 2018



Fundamentos de  Educação e Linguagem em DE MAGISTRO, de Santo Agostinho


          São inúmeras e inexauríveis as abordagens sobre o De Magistro, de Santo Agostinho, dada a profundidade do seu conteúdo. Distante da pretensão do ineditismo, este trabalho procurará tecer relações entre conhecimento, educação e linguagem e seus reflexos nas ciências modernas. Observar-se-á, por meio de leitura inferencial do Capítulo I - “ A finalidade da Linguagem”, como Agostinho, de forma assistemática, reflete acerca da finalidade da linguagem verbal e não verbal, desenvolvendo o conceito de signos em sua dimensão significante e significado a serviço de finalidades cognitivas da relação de ensino e aprendizagem, ou seja, aquisição do conhecimento.
         O diálogo intitulado De Magistro (sobre o mestre) é considerado uma das fontes mais profícuas de reflexão sobre Educação e Linguagem. Como neoplatônico, Santo Agostinho desenvolve os temas por meio de um processo de interlocução com Deodato, seu filho. Da perspectiva metodológica é possível identificar a dialética platônica, ou seja, o procedimento da interrogação para levar o interlocutor a pensar sobre o significado das palavras e encontrar suas próprias respostas. Ele, na condição de mestre, provoca o discípulo (1979, p. 349): “- Que te parece que pretendemos fazer quando falamos?” Ao que Deodato responde com dupla alternativa: ensinar ou aprender.
          Em De Magistro, Agostinho destaca o verbo ensinar como pretensão daquele que se serve da palavra, analisando-lhe o propósito comunicacional e cognitivo. O subtítulo do diálogo, sobre o mestre, corrobora o tema, pois a função do mestre é ensinar por meio da palavra ou sinais. Assim, o filósofo inquire Deodato e problematiza a função da linguagem verbal (a palavra): “— Vejo uma dessas duas coisas e concordo; com efeito, é evidente que quando falamos queremos ensinar; porém, como aprender?”
         Para Agostinho, as palavras verbalizadas ou pensadas não são neutras. Elas são tratadas como signos, ou seja, sinais exteriores (significantes) que carregam em si conteúdos (significados). Enquanto significantes ou sinais exteriores, as palavras são insuficientes para a significação das coisas. É necessário que elas comuniquem mais do que representam a fim de despertar, pela recordação, o ser interior ensinado pelo Cristo. Ao cumprir sua finalidade, as palavras e a memória das palavras se tornam instrumentos de ensino.
         Como neoplatônico, Agostinho difere de seu antecessor no que se refere à recordação ou o papel da memória.  Para o bispo de Hipona, a memória é uma faculdade da alma responsável por uma das dimensões da divina trindade. Em Santo Agostinho (1980, p.25) verifica-se que: “A memória, enquanto persistência de imagens produzidas pela percepção sensível, corresponderia à essência (Deus Pai), aquilo que é e nunca deixa de ser;(...). ” Nela está insculpido, indelevelmente, o endereço de Deus, de forma que as palavras acordam no interior da criatura humana significados divinos latentes. Dessa maneira, por iluminação, o homem realiza o verdadeiro conhecimento das coisas.
         Não por acaso, a questão permanece inconclusa ao final do diálogo. Eis a grandeza do filósofo. Temas universais não se restringem a uma época; devem seguir sua trajetória iluminando os séculos futuros. A produção intelectual do mestre de Hipona sobre a linguagem forneceu à Semiótica, à Linguística e à Comunicação fundamentos para a estruturação desses importantes campos de estudo. A educação deve-lhe importantes considerações acerca da aquisição do conhecimento por meio da mediação discursiva e sua função na relação ensino e aprendizagem. Por fim, a humanidade deve-lhe parte de sua própria história.

                                                                       Célia Firmino
                                                                  Reflexões Filosóficas
                                                                         16.03.2013

Referências:

SANTO AGOSTINHO (1980). Tópicos. São Paulo: Abril Cultural [Coleção Os Pensadores – volume Santo Agostinho].
________De Magistro. São Paulo: Abril Cultural [Os Pensadores – volume Santo Agostinho].

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