domingo, 30 de outubro de 2011

Incompletude

Há dias em que sinto uma inexistência infinita.
As dimensões do tempo diluem numa realidade eterna.
Não sei quem sou, nem me acho: labirinto interminável.
E, inconclusa, busco a solução do enigma de ser assim: indefinível.
A cada janela da memória, uma experiência incompleta,
um mosaico de mim se forma no etéreo ilimitado.
Sinto-me, apenas, e isso é tudo: uma realidade incerta.
E a angústia de não ser exata,
faz-me prisioneira, cativa do não-ser liberta.
Triste espectro me sustenta, assim, muda, ensimesmada.
E, na órbita de mim, personas variadas.
Eu, ora centro, ora extremidade,
Na surda agonia, de ser assim, efemeridade.
Quem dera, ser eu como a primavera,
cuja presença é essencial ao jardim.
Sem ela, as flores não seriam elas,
no colorido existir.
Quem dera, ser eu o próprio sol,
vital, aos pântanos, aos prados verdejantes.
Sem ele, a vida não seria luz, mas como eu, treva constante.
Inconcebível imaginar a vida sem a vida, atroz dilema.
E nesse delírio consciente, sentir a dor de ser ausente,
Na eterna realidade de ser assim,
incompleta e existente.
É ousadia do pirilampo sonhar ser estrela?
E nos pântanos abrigar a primavera?
Mas o que seria da esperança, não ser gerúndio
de uma paciente e infindável espera?
Viver assim é martírio, é quimera?
Mas o que faço eu de mim,
se já não sou o que fui, deixei-me na estrada.
Se lá fiquei, não me trouxe como bagagem?
Que farei eu de mim, na ânsia do término da viagem,
ao encontrar-me, de mãos vazias, nas estações do tempo,
para nenhum porto de passagem?

Célia Firmino